Europa em contrarrelógio para arranjar mais 745 mil camionistas até 2028 perante crise no setor dos serviços

A crise dos camionistas na Europa é uma questão que tem vindo a ganhar espaço mediático, uma vez que o problema tem crescido em gravidade e complexidade. Com a falta de mão-de-obra qualificada e a crescente procura por serviços de transporte, a indústria enfrenta desafios significativos que vão desde a escassez de profissionais até questões de competitividade e regulamentação.


De acordo com dados de 2021 da Associação Internacional de Transportes por Estrada (IRU), estima-se que sejam necessários pelo menos 425.000 camionistas na Europa. No entanto, prevê-se que até 2028, esse número possa chegar a 745.000 postos de trabalho vagos, sem que ninguém os ocupe.


A cena na fronteira entre a Roménia e a Bulgária oferece uma visão detalhada deste problema em crescimento. Camionistas como Alin, com décadas de experiência, enfrentam longos períodos de espera devido a limitações fronteiriças, tornando a profissão cada vez menos atraente para os jovens. Adnam e Saban, dois turcos veteranos da estrada, partilham ao El Confidencial histórias de camaradagem e resistência, mas também de frustração com os obstáculos burocráticos e regulamentares que tornam a vida de camionista um desafio diário.


Constantine, um camionista romeno de 52 anos, destaca a hostilidade e o estigma associados à profissão, incluindo o lançamento de pedras e insultos por parte de colegas que acreditam que ele está a tentar furar a fila. Apesar de todos os desafios, Constantine ama o seu trabalho, que escolheu após obter o seu primeiro cartão de camionista durante o serviço militar. No entanto, a vida na estrada tem um preço pessoal, com Constantine a passar 20 dias longe de casa por mês, incluindo o seu 52º aniversário, que passou sozinho num parque de estacionamento.


Radu Dinescu, secretário-geral da UNTRR, exprime a sua preocupação com a atratividade decrescente da profissão: “Como vamos atrair jovens ou mulheres para esta profissão, quando os camionistas têm que esperar um dia para cruzar a fronteira?”. Os salários também são uma preocupação, variando drasticamente entre os países. Enquanto um camionista típico em Espanha ganha 1.950 euros por mês, na Roménia o salário é de apenas 565 euros.


Rubén García, um DJ madrileno que se tornou camionista após perder o seu emprego, partilha a sua experiência de conduzir camiões carregados de produtos espanhóis para o estrangeiro. Embora o salário fosse atrativo, a vida na estrada era exaustiva e solitária. Este caso ilustra a falta de diversidade na profissão, com apenas 5% dos camionistas europeus com menos de 25 anos e apenas 6% mulheres.


A crise dos camionistas é ainda mais grave nos países da Europa Oriental. Yordan Arabadjiev, do SIndicato de Trasportadores da Bulgária, relata que muitos camionistas búlgaros estão a abandonar o país em busca de melhores salários e condições de trabalho no estrangeiro. Michal, um camionista checo, vive em Ostrava mas trabalha para uma empresa alemã, conduzindo duas semanas seguidas e regressando a casa outras duas. Descreve o seu trabalho como um “pesadelo” que arruinou o seu horário de sono e o deixou a comer salchichas durante duas semanas.


Edwin Atema, um sindicalista holandês, explica que a falta de relevo geracional na profissão é um problema crescente. “Na época em que eu conduzia o camião, os filhos dos camionistas costumavam tornar-se camionistas porque viam o que acontecia aos pais”, diz Atema. No entanto, os custos elevados das cartas de condução e licenças em toda a Europa tornaram-se um obstáculo significativo, variando de 1.000 euros na Roménia a mais de 5.000 euros em França.


A crise dos camionistas não é apenas uma questão de salários e condições de trabalho; é também uma questão de estratégia económica e política. A polémica em torno do “social dumping” (competência desleal) e a guerra na Ucrânia, que levou à perda de 166.000 camionistas, exacerbaram ainda mais o problema.


Em Espanha, o sindicato FSC-CCOO denuncia que há empresas de transporte que estão a procurar trabalhadores na América Latina por salários abaixo do mínimo legal. A questão não é a falta de camionistas, mas as condições precárias de trabalho que tornam a profissão pouco atrativa.

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